7 etapas importantes na valorização dos instrumentos tradicionais

Em JM-Madeira

A Madeira assistiu nas últimas décadas a um forte rejuvenescimento na prática dos instrumentos tradicionais, principalmente nos designados “cordofones tradicionais madeirenses”: braguinha, rajão e viola de arame. Tendo em consideração que o caso da Madeira é singular a nível nacional, pelo elevado número de crianças e jovens que praticam atualmente estes instrumentos, fica aqui uma breve síntese de sete etapas essenciais, que contribuíram para a valorização destes instrumentos.

1. Os estudos de Carlos Santos – o processo de estudo e valorização dos “cordofones tradicionais da Madeira” começou, de forma fundamentada e sistemática, com o jornalista e folclorista Carlos Santos. Na década de 1930, Carlos Santos direcionou os seus interesses para a música de cariz tradicional e começou a realizar estudos etnográficos, que foram imprescindíveis para a fundação de um conjunto alargado de grupos de folclore madeirense. O resultado destas investigações ficou compilado em três livros sobre o folclore madeirense, tendo especial importância o livro Tocares e cantares da ilha, edição onde define que são originários e tradicionais da Madeira os instrumentos braguinha, rajão e viola de arame.

2. Os estudos de Jorge Dias e Ernesto Veiga de Oliveira – na década de 1960, dois investigadores portugueses – Jorge Dias e Ernesto Veiga de Oliveira – realizaram estudos onde referenciam os instrumentos tradicionais da Madeira, ganhando especial relevo o braguinha, principalmente pela sua semelhança com o cavaquinho e devido à sua difusão para o Brasil e para o Havai. Estes estudos têm a particularidade de demonstrar a importância dos instrumentos da família da viola nos estudos de migração e de difusão cultural, o que veio potenciar a relevância social destes instrumentos musicais.

3. Estudos sobre os instrumentos portugueses no Brasil e no Havai – além dos estudos realizados a partir de uma perspetiva portuguesa, há que ter em consideração um conjunto de investigações surgidas nos territórios para onde os portugueses levaram estes instrumentos. Por exemplo, o investigador brasileiro Alberto Ikeda salientou que, apesar da origem portuguesa, o cavaquinho tornou-se tão identificado com a música brasileira, que despertou um novo interesse dos investigadores locais. No Havai, investigadores como John King e Jim Tranquada procuraram compreender melhor a origem do ukulele na Madeira e publicaram estudos nesse sentido.

4. A difusão dos instrumentos nas escolas da Madeira – aos interesses académicos e de âmbito folclórico, juntou-se, no último quartel do século XX, a vertente educacional. Na Região Autónoma da Madeira, através do projeto do Gabinete de Apoio à Expressão Musical e Dramática, liderado por Carlos Gonçalves, começou a introduzir-se, na década de 1980, os cordofones tradicionais no ensino genérico e, atualmente, existem aproximadamente 1300 crianças a estudar estes instrumentos em contexto escolar, no 1.º ciclo do ensino básico. No resto do ensino obrigatório, apesar de haver um menor número de alunos a praticar este instrumento, ainda existem algumas centenas de executantes. De salientar que os cordofones tradicionais da Madeira são lecionados há cerca de três décadas nas atividades extraescolares da Direção de Serviços de Educação Artística e Multimédia (DSEAM) e, mais recentemente, no Conservatório – Escola Profissional das Artes da Madeira. É igualmente de realçar o trabalho realizado nesta área pela Associação Musical e Cultural Xarabanda.

5. A recuperação musicológica de repertório oitocentista – mais recentemente, os trabalhos do musicólogo Manuel Morais sobre o repertório erudito para Machete (designação dada ao Braguinha até ao primeiro quartel do século XX) vieram aumentar consideravelmente o repertório para este instrumento e os conhecimentos históricos existentes. Atualmente, devido ao trabalho deste investigador, conhecem-se algumas centenas de peças do século XIX para machete, sendo de salientar que Morais também fundou e dirigiu artisticamente o grupo “Quinteto Drumond de Vasconcelos”, com o qual gravou dois CDs para a DSEAM.

6. Investigações sobre a utilização em contexto escolar – a partir de 2010, têm surgido um conjunto de dissertações e relatórios de estágio de mestrado, onde se apresentam estudos e estratégias sobre a utilização destes instrumentos no ensino: desde a utilização em clubes escolares de cordofones (Duarte Inácio); passando pela utilização na disciplina de música no 3.º ciclo do ensino básico (Roberto Moniz); pelo estudo do aumento da motivação e da aprendizagem dos alunos (Duarte Romão); pela utilização do instrumento braguinha para promover a criação musical (Roberto Moritz); pela aproximação às famílias, através de aulas para Alunos e Pais (Catarina Gomes); passando pela relevância em aprendizagens musicais e sociais, através da integração em orquestra de cordofones (Tiago Lobato); até, finalmente, à utilização dos cordofones em estilos musicais como o Pop-Rock (Nuno Mendonça).

7. A edição de novo repertório – surgiram nos últimos anos um conjunto significativo de edições que têm vindo a renovar e a atualizar o repertório para estes instrumentos, entre os quais se salienta: um manual de iniciação ao braguinha (Roberto Moritz e Rodolfo Cró); um CD-ROM com repertório coletivo para grupos em contexto escolar; CDs com repertório original para rajão e viola de arame (Vitor Sardinha); livros com peças para braguinha a solo; um livro com acordes, técnicas e enquadramento histórico dos instrumentos (Roberto Moniz); e CDs de grupos de música tradicional; entre outras edições.

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