Como melhorar a cultura em 55 minutos


por Paulo Esteireiro em JM-Madeira

Albert Einstein supostamente terá dito que «se tivesse uma hora para resolver um problema, e a minha vida dependesse disso, eu utilizaria os primeiros 55 minutos a estudar o problema e apenas cinco minutos a pensar nas soluções.» É verdade que a atribuição da autoria desta frase a Einstein é um pouco duvidosa, fruto dos novos tempos em que somos bombardeados com excesso de informação falsa. No entanto, mesmo que Einstein nunca tenha proferido esta afirmação, ela contém uma mensagem forte, que tem levado milhares de pessoas de todo o mundo a partilhá-la e a identificar-se com ela. E o motivo para o sucesso desta suposta afirmação de Einstein é claro: constantemente vemos à nossa volta a tentação para implementar soluções rápidas e superficiais, em problemas complexos, que não compreendemos e para os quais não gastámos tempo a realizar estudos, que contribuam para a melhoria da nossa compreensão dos problemas. O resultado acaba por ser sempre o mesmo: gasta-se energia em soluções para problemas pouco importantes – em detrimento de questões prioritárias – ou em soluções que só resolvem superficialmente os problemas e de forma pouco sustentável.

Isto acontece no local de trabalho, por exemplo, quando se gasta tempo – por vezes meses ou anos – a conceber produtos ou serviços que ninguém quer ou tem interesse, o que poderia talvez ser evitado com a realização de um estudo que tivesse ouvido previamente as pessoas interessadas. O mesmo acontece no plano político, onde é frequente vermos as verbas públicas serem distribuídas sem uma estratégia de fundo ou qualquer estudo que permita conhecer melhor o terreno ou o desenvolvimento de um plano de ação. E não há como fugir. Mesmo que tenhamos uma intuição e uma sensibilidade elevada, sem estudos aprofundados que envolvam os intervenientes de uma área, é difícil saber quais são os reais problemas, definir as prioridades e, consequentemente, ter uma estratégia e um plano de ação. Creio que todos nós teremos em mente alguns casos em que se desbaratou dinheiros públicos, por falta de estudos e debates, não sendo necessário aqui entrar em casos concretos polémicos desnecessariamente.

O caso inglês é, em alguns campos, um bom exemplo. É prática comum o governo comissionar, numa personalidade de relevo, a realização de um estudo ou relatório que vise a melhoria da área da especialidade da personalidade em causa. Por exemplo, Darren Henley, o atual “Chief Executive” do Arts Council England (Conselho das Artes de Inglaterra), realizou dois estudos independentes para o Governo sobre educação musical e cultural – a pedido do Secretário de Estado da Educação –, que resultaram no Plano Nacional para a Educação Musical, e num conjunto de redes de parcerias, tais como o Programa de Escolas e Museus, “BFI Film Academy Network” (Rede da Academia do Instituto de Cinema Britânico) a “National Youth Dance Company” (Companhia Nacional Juvenil de Dança), a “Heritage Schools”, etc.

Para além das consequências diretas, acima referidas, dos dois relatórios comissionados por Darren Henley, um dos aspetos que mais me impressionou foi o facto do departamento de educação, que encomendou os estudos, ter realizado um documento em que indicava a sua resposta a cada uma das recomendações propostas por Henley. Por aqui se vê a grande importância atribuída aos estudos realizados, que tiveram direito a uma resposta exaustiva governamental, onde se indicava o parecer oficial e as medidas que iriam ser tomadas. Muito diferente do clássico estudo para “meter na gaveta”.

Um outro aspeto muito relevante destes estudos de Henley foi o grande envolvimento de personalidades e organizações. Num deles, foram ouvidas 972 pessoas e organizações, tendo sido a partir deste conjunto muito alargado de propostas que foram organizadas as recomendações do estudo.

Pessoalmente, acho que seria profundamente benéfico as entidades competentes, quer municipais, quer governamentais, ouvirem novamente os agentes culturais e as organizações do setor cultural, para desta vez se fazer um relatório com recomendações e posteriormente um plano regional para a cultura, ao exemplo do que é feito para o turismo. Creio que cada vez mais é urgente reunir as diferentes entidades e personalidades em projetos conjuntos e as autoridades públicas estão numa posição privilegiada para fazer essa união. Cada organização dificilmente terá dimensão para crescer ou mesmo sobreviver individualmente aos obstáculos que se vivem na área cultural e conseguir fontes de financiamento (salvo raras e honrosas exceções, que só vêm confirmar a regra). No desporto os clubes têm de se unir para terem um campeonato e jogarem entre si, apesar das discórdias. É hora de na cultura criarmos projetos conjuntos que levem a unir os esforços das diferentes entidades. Quando iremos gastar os nossos “55 minutos” e deixar de seguir as sensibilidades e intuições pessoais?

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