
Apesar da obra instrumental de Vivaldi, nomeadamente os concertos, ocupar um lugar de maior protagonismo na história da música do que o ocupado pela sua obra vocal, casos como o desta sua ópera “Bajazet” deixam-nos algo espantados com este facto. Vivaldi compôs em vida cerca de 64 óperas (!), tendo alcançado um sucesso muito significativo na primeira metade do século XVIII. A sua escrita vocal é extremamente expressiva, dramática, virtuosa e agradável de ouvir. As histórias estão repletas de personagens bem construídas nos planos emocional e musical, que se integram de forma coerente nas intrigas. No entanto, nenhuma das óperas de Vivaldi conseguiu alcançar um lugar de destaque no actual circuito operático internacional, sendo o compositor Veneziano geralmente pouco considerado no género.
Se nos alhearmos deste estatuto minoritário das óperas de Vivaldi, podemos observar que Bajazet é uma ópera fantástica. A rivalidade entre o sultão Bajazet e o tártaro Tamerlano foi um tema recorrente dos libretistas do século XVIII, que muito atraiu os compositores da época (desde Gasparini a Jomelli, passando por Handel, até Leo e Porpora). Apesar de Bajazet ter sido um inimigo de peso do Ocidente, acaba por ser uma figura que atrai simpatia neste libreto, devido à sua bravura e orgulho na desgraça e queda perante o terrível Tamerlano (que ficou famoso com a história das 120 torres que construiu à porta de Bagdade – cada uma com 750 cabeças humanas!).
Na parte musical, a ópera não foi toda composta por Vivaldi, sendo uma ópera pasticho – uma ópera constituída por árias de vários compositores. Este facto ganha um especial simbolismo quando se repara que as árias compostas por Vivaldi são as das personagens mais íntegras e de maior carácter no libreto (Bajazed, Asteria e Idaspe), enquanto que para as personagens mais “negras” (Tamerlano, Andronico e Irene) , Vivaldi foi na sua maioria buscar música a compositores napolitanos.
As partes vocais são extremamente virtuosas, repletas de ornamentação de grande efeito, sendo um bom exemplo disso a ária de Irene “Qual guerriero in campo armato” (um virtuosismo ofegante, excelentemente conseguido pela mezzo-soprano Vivica Genaux). É certo que muitas árias exigem mais agilidade técnica do que expressão, mas no global as árias são muito expressivas exigindo uma boa dose de teatralidade.
Este dramatismo é exigido pela harmonia de Vivaldi. É frequente o compositor usar as modulações tonais para conseguir maior carga dramática e fugir a algum vazio das partes excessivamente ornamentadas. A parte instrumental é outro ponto onde Vivaldi é excepcional. Ao contrário de muitos compositores de ópera, Vivaldi usa a Orquestra como contraponto expressivo que consegue introduzir maior carga dramática às árias e dar o carácter aos cantores.
O álbum traz ainda um DVD de trinta minutos como bónus, onde é possível ver os seis solistas a cantar cada um deles uma ária.
Vivaldi, “Bajazet”, CD duplo e DVD, EMI
Comentários